quinta-feira, 10 de julho de 2008

Justiça

Justiça era seu nome.Justiça.Sim,podia parecer estranho,mas foi sua mãe,Dna Dorinha
que a tinha batizado com esse nome,Justiça de Oliveira Ferraz.Na hora do parto,se lembrando de toda dificuldade que teve ao se casar com Seu Fernando,homem de posses e ainda por cima branco,foi o primeiro nome que lhe veio a cabeça,bem,na verdade o primeiro foi "vingança",mas esse seria um nome estranho para um toquinho de gente não é?!Apesar da perplexidade de todos,e o coro contra,foi esse nome que ficou.Dna Dorinha era a teimosia em pessoa, alguns anos atrás,20 precisamente,no baile do Clube de Jaboticabal,ela conheceu Fernando,loiro,de olhos claros,alto,filho de funcionários públicos,era o mais disputado dos homens da pequena cidade,quando Dorinha o viu pela primeira vez,todo elegante,de terno azul,cheiroso que só,pensou:
-Ah esse homem vai ser meu!!!
Quando começou a tocar aquelas músicas que tanto conhecia da Jovem Guarda,la foi ela,
toda rebolativa pelo salão,jogando seu charme e mostrando o que tinha de mais bonito:as pernas,e que pernas,tão formosas que até Seu Jonas da farmácia,seu maior admirador oculto, exaltava sempre suas coxas,claro que escondido de Dna Vitória,italiana de sangue quente,falada na cidade pelas supostas agressões ao marido com toalha molhada.Fernando que não era bobo e nem nada,logo percebeu aquela mulata faceira,de corpo bonito e sorriso cativante, e foi logo se jogando,pegando a moça pela cintura e dando um show no meio do baile,dali para o namoro foi um pulo e um escândalo em toda cidade,principalmente na casa dele,seus pais não aceitavam a ideia de jeito nenhum,preconceituosos ao extremo nem podiam imaginar a ideia de ver o filho namorar,como diziam, uma "moça de cor",quanto mais casar e quiçá ter filhos mulatinhos,seria a vergonha da família,mas contra o amor não tem jeito,em
5 meses estavam casados e ela grávida do seu primeiro filho.Depois de muitas dificuldades e uma gravidez complicada,Justiça nasceu e com ela um pouco de paz na vida do casal.Assim os anos foram passando,a menina foi crescendo, com o peso do preconceito e do nome,afinal não era qualquer um que podia levar nas costas um nome desses,virou mulher e com a maturidade veio as formas exuberantes do corpo que tanto mexiam com a imaginação dos rapazes e a decisã,o até então, mais importante da sua vida ,a entrada na faculdade.Claro que com esse nome poderia ter escolhido mesmo o curso de Direito,queria lutar contra as diferenças desse mundo,contra o preconceito bobo das pessoas,queria mudar o mundo e nisso tinha o total apoio dos pais,o que não entrava mesmo na cabeça de Dna Dorinha era que Justiça não queria aproveitar o sistema de cotas que o governo oferecia para as pessoas de cor negra,afinal em sua cabeça,depois de séculos de escravidão e todo tipo de humilhação,nada mais justo do que uma
reparação do governo,mas Justiça não queria nem ouvir falar disso,preferia estudar,estudar e estudar no seu cursinho particular e deixar essas vagas para quem necessitasse de verdade,achava que não deveria haver cotas para negros e sim cotas para quem não tivesse condições financeiras para pagar uma universidade,independente da cor de pele.E como ela desejou, aconteceu,passou em primeiro lugar no curso de Direito em uma universidade importante da capital,sem cotas,mas com
muito esforço e dedicação.Algum tempo depois descobrira que Renata,negra também,filha de
uma ex- empregada sua, tinha sido aprovada , que em outra faculdade,num sistema parecido com o de cotas.Justiça ficou satisfeita.Achara que justiça tinha sido feita.

Alex Penedo

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