quinta-feira, 10 de julho de 2008

Mãe de verdade

A leiteira assoviava a horas.Um barulho alto.Aquele som chato,zunindo nos ouvidos de Edna não a tiravam do seu transe.Estava horas com aquele pedaço de jornal na mão,sem acreditar na notícia que lia, uma mãe jogara sua própria filha pela janela,parecia surreal,ainda mais para ela que há anos lutava para ficar grávida e não conseguia.Quanto mais lia,menos acreditava e mais revoltada ficava,como podia Deus lhe negar uma graças dessas e ser generosa com esse tipo de mulher ,se perguntava.
A vida de Edna não estava sendo fácil,desde que se casou com Gilberto,depois da lua de mel tinha uma coisa na cabeça:ser mãe,não que que Gilberto também não pensasse nisso,pensava claro,mas não era igual ,para ela era uma questão fundamental,até porque todas suas irmãs e cunhadas já haviam tido filhos,ela era a única "ventre seco",como dizia uma de suas cunhadas invejosas,e isso a incomodava muito.Ainda se lembrava do último Natal na casa dos pais de Guilherme,quando Dna Gilzete na hora de cortar o peru falou:
-Agora todos fazendo pensamento positivo,no próximo ano,a Edna vai ter uma surpresa para nós,se Deus quiser!!!
Vermelho,sim, vermelho, a cor que mais a definia naquela hora,talvez porque era essa a cor que estava em seu rosto.Humilhação.Edna prometeu a si mesmo que faria tudo,tudo mesmo,mas que no próximo ano estaria grávida.Assim começou sua via crucis,exames e mais exames,tudo em ordem com os dois,como constataram os médicos,foi do candomblé a igreja evangélica,da católica a umbanda,até a uma espírita que materializava objetos no algodão ela foi.E nada.Se não tinha problemas,porque não engravidava, pensava ela.Talvez carma,talvez tinha sido muito ruim em outra encarnação ou como dizia sua avó Maria,não era merecedora de ser mãe.Edna não aceitava,alguns amigos já tinham sugerido a ideia de adotar uma criança,afinal ,diziam eles,com tantas crianças abandonadas por aí precisando de carinho e atenção,mas Edna achava que isso seria aceitar a derrota,isso sim seria humilhação ,dar munição para os vizinhos e parentes falarem dela,e isso não iria aceitar de jeito nenhum.O tempo foi passando e nada,Edna ficando cada vez mais nervosa,descontava qualquer coisa em cima do pobre marido,parou de trabalhar,de limpar a casa, não tinha mais alegria para nada,com isso até seu casamento foi para o brejo,Guilherme um dia pegou suas trouxas e se mandou para casa da mãe.Edna nem ligou,melhor, dizia ela,agora não vai ter mais cobrança de nada e nem de nínguém.Com o tempo foi se acostumando a ficar sozinha,a vida foi retomando a normalidade e ela foi esquecendo seu sonho de ser mãe.Um dia ao atravessar a rua deu de cara com seu ex -marido com um bebe no colo,achou estranho,será que Guilherme havia se casado novamente e tido um filho?conversa vai,conversa vem,ele contou que havia se casado com uma colega de serviço que já tinha um filho ,depois de alguns meses essa moça fugiu e o deixou com o bebe.Gabizinha era seu nome,toda rosadinha,tinha completado 1 ano semana passada.Foi amor a primeira vista.Seu instinto materno havia voltado com tudo.Guilherme deu a idéia de a criarem juntos.Era a coisa que mais queria,aliás era muito mais do que imaginara.Virou mãe.Hoje ao meio de fraldas sujas e noite mal dormidas,Edna se sente satisfeita.Deus escreve certo por linhas tortas.

Alex Penedo

Nenhum comentário: